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14.12.08

O primeiro dinossauro angolano

Uma equipa de investigadores de Angola, E.U.A., Holanda e Portugal desenvolve uma campanha de estudos paleontológicos, com trabalhos de campo no Namibe entre 2005 e 2007. Descobriram o primeiro dinossauro angolano.





O deserto do Namibe nasceu há 100 milhões de anos, numa altura em que o Atlântico era ainda um projecto da Natureza e Pangeia não se tinha dividido totalmente. É de supor, portanto, que a costa angolana seja um lugar privilegiado para os estudos paleontológicos.

Agora que o espectro da guerra se dissipou, uma equipa de investigadores de Angola, E.U.A., Holanda e Portugal, de entre os quais o pioneiro angolano dos estudos sistemáticos sobre répteis e peixes cretácicos, o paleontólogo Miguel Telles Antunes, desenvolve uma campanha de estudos denominada PaleoAngola, com trabalhos de campo realizados entre 2005 e 2007 numa zona entre o sul de Ambriz e o norte do Namibe.

“«Cuidado para não pisarem os fósseis, já cá estamos», alertou Michael Polcyn. As escavações concentraram-se numa área bastante pequena, mas extremamente rica em fósseis. Era impossível não caminhar sobre dentes e ossos com mais de 65 milhões de anos. O Namibe é o paraíso para quem estuda estes animais. O terreno é seco e arenoso com pequenos vales que escorrem de um planalto em direcção ao oceano. Muitas dessas encostas expõem ossos fossilizados e a quantidade de fósseis permitir-nos-á «construir uma imagem muito mais clara da vida no oceano no final da idade dos dinossauros», explicou Polcyn.”

Foram encontrados mosassauros, os grandes predadores marinhos da época aparentados com os lagartos monitores, pterossauros, os répteis voadores e plesiossauros, répteis essencialmente piscívoros, descobertas “bastante importantes, já que são os mais completos plesiossauros encontrados na costa ocidental africana” e que ajudam “a co-relacionar a distribuição destes animais no «proto-Atlântico» que se formava no final da era dos dinossauros».”

A jóia da coroa da expedição foi a descoberta do paleontólogo Octávio Mateus: um dinossauro “aparentado com os diplodocóides, um grupo de saurópodes em declínio naquela época”, achado de grande importância uma vez que os únicos saurópodes “que se conhecem do Cretácico Superior de África foram recolhidos em Madagáscar, no Egipto e no Níger, ou seja, a mais de 2.500 km de distância. Este é, portanto, o primeiro dinossauro de Angola e uma das poucas ocorrências de dinossauros saurópodes na África subsaariana […] com cerca de 90 milhões de anos.

Sabia-se que Angola era rica em répteis do Cretácico, mas só agora compreendemos a diversidade daquelas águas. Pelo menos sete espécies de mosassauros, duas de plesiossauros, uma de dinossauro, outra de pterossauro, algumas tartarugas marinhas e dezenas de espécies de peixes foram encontradas, mas ainda há muito trabalho por fazer. Depois de três campanhas imersos naquilo que faz lembrar a versão cretácica da costa dos Esqueletos, a contagem de espécimes parece não terminar.”

admário costa lindo


fonte e citações:
CASTANHINHA, Octávio Mateus e Rui. Grande Angular, PaleoAngola, Predadores do Atlântico primitivo, National Geographic Portugal nº 91, Lisboa, Outubro 2008.

4.12.08

Amor de índio

O Angola Haria esteve de férias forçadas. Continua ainda, na verdade. Foi o pulso direito que parti e que me impediu de escrever, é agora (desde 17 de Outubro, imagine-se) um problema qualquer na linha telefónica que não há meio de se resolver… (já aqui disse que a zona onde moro é desprivilegiada, tirando a época de eleições… depois chamam-me nomes… e qualquer dia levam-me a tribunal… modismo cá pelo burgo!)


Foi tempo de aproveitar para pôr a leitura em dia, escrever e arrumar biblioteca e arquivos.
Foi assim que revi e reli isto que vos mostro.

AMOR DE ÍNDIO1 “Fiquei emocionada com uma foto que vi no jornal Folha de S. Paulo de Novembro do ano passado, mostrando uma índia com o filho no colo, amamentando um filhote de porco do mato. É incrível o amor dos índios pela natureza. Gabriela Dias Rodrigues, São Paulo, SP” - “Nós também gostamos, Gabriela. Tanto que a estamos publicando nesta secção. A foto, de Pisco Del Gaiso, ganhou o Prêmio Internacional de Jornalismo Rei de Espanha, no ano passado em Madri.”




Lembro-me de, há não muito tempo, um autarca deste jardim-à-beira-mar-plantado ter dito à rádio e à televisão – pois claro, o que seria de certos indivíduos se não houvesse essa coisa chamada cobertura mediática – com um desplante no mínimo boçal, qualquer coisa como isto: “ - E vamos ter que parar a construção da estrada por causa de um rato! Isto é incrível!”



Incrível é a mentalidade do senhor plejidente da junta-câmara-ou-seja-lá-o-que-for. Deste e de outros. É aquilo que nos mostra o detentor do poder em Portugal, grande parte das vezes: ignóbil porque abjecto e analfabruto porque se arroga princípios de sabedoria saloia (sem desprimor para os ditos) quando não passa de um ignorante que se recusa ver as evidências que lhe são demonstradas.


Em causa estava o habitat do rato-de-cabrera, Microtus cabrerae, irremediavelmente destruído se a construção da estrada prosseguisse.


O rato-de-cabrera2 é um roedor “especial porque só ocorre na Península Ibérica” e que, “não estando em perigo de extinção, encontra-se porém ameaçado”, uma espécie com o estatuto de “rara”. “Só a nossa vontade de proteger o seu habitat dá garantias para a sua sobrevivência.”
“A situação do rato de cabrera não é das mais animadoras. Para Paula Canha,3 «a população destes ratos está em declínio, sobretudo nas zonas mais junto do litoral onde funcionam explorações agrícolas com uso intensivo do solo. Onde se mantiver a agricultura típica desta região é possível a conservação do seu habitat», conclui. Pastoreio intensivo, cultura com rotação e pousios, que alguns agricultores insistem em manter através dos tempos, são essenciais para o equilíbrio natural desta espécie.”


A imagem abaixo representa o habitat do rato-de-cabrera, um ciclo de vida natural que, mesmo com a intervenção do homem do tractor – mantendo a técnica agrícola tradicional - consegue ser sustentável. Imaginem o que seria tudo isto cortado por uma estrada de alcatrão! O equilíbrio ecológico seria destruído: os animais e plantas desapareceriam, pelo solo passaria a erosão e o homem limitar-se-ia a arar um deserto. Nada mais estúpido!



legenda
1. Rato-de-cabrera, Microtus cabrerae - A. macho, B. fêmea, C. recém-nascido, D. juvenil da 1ª semana, E. juvenil 2ª/3ª semanas, F. juvenil do último estádio; 2. Ralo, Gryllotalpa gruyllotalpa; 3. Minhoca, Lumbricus sp.; 4. Louva-a-deus, Mantis religiosa; 5. Cão, Canis lupus familiaris; 6. Garça-boieira, Bubulcus ibis; 7. Argiope, Argiope bruennichi; 8. Boi, Bos sp.; 9. Cavalo, Equus sp.; 10. Ovelha, Ovis sp.; 11. Cegonha-branca, Ciconia ciconia; 12. Junco, Scirpus holoschoenus; 13. Coruja-das-torres, Tyto alba; 14. Sobreiro, Quercus suber; 15. Águia-de-asa-redonda, Buteo buteo; 16. Peneireiro-vulgar, Falco tinnunculus; 17. Doninha, Mustela nivalis; 18. Toirão, Mustela putorius; 19. Raposa, Vulpes vulpes; 20. Gineta, Genetta genetta.

“Mas que importância tem isto mais esta dúzia de animalecos inúteis?” – perguntará o senhor plejidente.


A índia da foto, ao alimentar a cria do porco do mato, está a reparar um mal talvez provocado por algum plejidente-caçador que lhe matou a mãe.


A índia nunca será plejidente, mas sabe a resposta que lhe foi transmitida pelos avós, que recolheram da Natureza a sabedoria necessária:


- Quem despreza a Natureza, quem não respeita animais nem plantas, não respeita o Homem, Homo sapiens, o espécime colocado no topo da Pirâmide Natural!

Sem nós, a Terra sobreviveria; sem ela, no entanto, nós não poderíamos sequer existir.”4

admário costa lindo


Ver mais, do mesmo: outra imagem, outras palavras:
A nossa celebrada inteligência I
A nossa celebrada inteligência II

notas
1. Cartas, As opiniões de nossos leitores, Os Caminhos da Terra, Ano 3 Nº 1, Editora Azul, São Paulo, 21.01.1994.
2. citações e imagens: Sérgio Coimbra, Nuno Correia, Fernando Correia e Nuno Farinha. E o Campo Pariu um Rato, National Geographic Portugal, nº 21, Dezembro 2002.
3. licenciada em biologia e professora na Escola Secundária de Odemira.
4. Alan Weisman. O Mundo Sem Nós, Estrela Polar, Cruz Quebrada, 2007.